quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Reticências...

Adeus, 2014. Sabrina Sanfelice, 31 de dezembro.

Os primeiros fogos de artifício colorem o céu de 2015! Olho para cima e depois vislumbro no horizonte, ainda quente, o adormecido ano de dois mil e quatorze. Suas pálpebras começam a baixar e ele ainda me acena, respirando fundo, cada vez mais lentamente e calmamente, como se aos poucos sonhasse com seus melhores momentos para cada um dos seres humanos que tocou. E esboça um sorriso pelo canto da boca, como uma criança sonhando com as longas tardes de vestígios do ontem, brincadeiras e risadas, os motivos exatos de cada uma das alegrias alheias.

E me despeço, como aquela que sai de cena, por opção própria, mas que não deixa de agradecer toda a experiência mágica que a transformou em cada hora ou segundo de possibilidades. Na minha mão esquerda, seguro as mãos daqueles que tocaram fundo meu coração. Amigos, amores, tão íntimos, tão queridos, que recitaram poemas ao pé do ouvido quando tudo tinha jeito de festa e, noutras vezes, o trágico sabor da desgraça. Mãos quentes, mãos de gente, calor humano que vai alastrando o corpo todo até virar um abraço forte e terno, que aconchega, acalma, perdoa, absolve, apaixona. Na mão direita, seguro firme as páginas de um livro, novo, o primeiro, a satisfação, a realização, o amor. Tão sublime, seu peso, na balança da vida, leve como pena, forte como chumbo. E leio, na primeira página, velha e sábia: verdade.

O que sobra de mim, nessa imagem sacrossanta, agarrada ao pedestal que me sustenta, um anjo que rege a própria vida e assim se condena à própria sorte, as duas mãos ocupadas com a vida, as escolhas, sobra, então, o coração. Assim, exposto, como o sagrado, parte espinho, parte flores, pode-se ver pulsante, vivo, rubro, apaixonado. Nas veias que sobem pelo pescoço, nota-se um certo volume, o aperto que o sangue vermelho vibrante causa ao ir para o cérebro, como quem diz: temas, mas deixe-me fluir! E aos poucos, ao tomar conta de tudo, vai impulsionando a vida, essa, que segue, rumo ao inesperado ano novo!

Pego um copo de qualquer coisa, água e vinho, porque a euforia me contagia, essa ansiedade louca de correr e pular no pescoço da vida. Ouço cada rojão que estoura no céu, danço e rodopio, no meio da rua. E já não sei quando parar, qual será o primeiro rosto a olhar quando abrir os olhos. E escolho abri-los ainda girando, para mostrar que posso olhar para tudo ao mesmo tempo, sem perder nada, porque não tenho posse do que me faz viva e ao mesmo tempo contenho cada gota do que já preenche o que sou. E vejo, de novo, no horizonte, agora totalmente adormecido, embalado pela experiência viva da única coisa que faz com que possamos ter certeza de qualquer coisa que fomos, somos e talvez, talvez... Fecho os olhos, em prece, junto com aquele que vai embora, agora, totalmente embalado pelo sono dos ébrios e desejo. Uma estrela cadente pode ter cruzado o céu nesse momento, não saberei. Todas as portas se abrem, uma a uma, sem chaves, tenho o poder de trancar o que quero, atravessar... Mas, por hoje, só por hoje, elas permanecem abertas na alma desse ser um pouco mais transformado.


Feliz, feliz 2015!